As Ideias No “Entre-Lugar” - Capitalismo, Liberalismo E Cultura Na América Latina (Séculos Xix E Xx)

As ideias no “entre-lugar” Capitalismo, liberalismo e cultura na América Latina – Séculos XIX e XX Leonardo Nominato Mantovani Santos – turma HIS100-B

No final do século XIX e limiar do XX, a América Latina vivenciou movimentos ideológicos de questionamento das influências europeias e o seu modo de pensar o mundo. Argentina, México e Peru foram palcos desses movimentos vanguardistaslibertários em relação à Europa. Houve a reafirmação de um posicionamento político de independência em relação às imposições culturais, econômicas e sociais do Velho Continente. Questões sobre centro e periferia, capitalismo e liberalismo encontravam ressonância nas artes e no campo das ideias. Nesse mesmo período, o México presenciou o capítulo inicial de sua longa trajetória revolucionária que, entre idase vindas, consagrou a vitória do reelaborado Partido Revolucionário Institucional (PRI). Argentina e Peru também indicaram uma proposta de reformulação do ideário de dependência da América Latina em relação à Europa e, em certa medida, aos Estados Unidos que despontava como eixo difusor de uma cultura homogeneizada e utilitarista. Os anos 1970 assistiram a uma forte retomada dessas ideiascolocadas nas primeiras décadas do século. E é justamente nesse contexto que se insere o debate entre intelectuais acerca do liberalismo e do eurocentrismo no Brasil e na América Latina. No Brasil as ideias liberais circulavam desde o século XIX. Naquele período, ainda que esse pensamento fosse difundido entre os intelectuais, na prática não encontrava repercussão. Isso porque, tradicionalmente, desde acolônia, o Brasil era notadamente marcado por um forte centralismo, tanto na administração quanto nas relações sociais. O autoritarismo se fez presente em todas as esferas: cultural, social e econômica. Essa percepção avançou os séculos e foi (re) elaborada como uma permanência em nossa história. Daí a versão sobre a prática do “favor”, que passou para a memória popular como o “jeitinhobrasileiro”. Por estas e outras questões, aqui não arroladas, Roberto Schwarcz escreveu que, durante os Oitocentos, as ideias liberais no Brasil estavam desencontradas, ou seja, estavam fora do lugar. Apesar das inúmeras críticas recebidas pelo seu estudo “Ao vencedor as batatas”, cabe ressaltar o seu esforço para tentar compreender as apropriações do liberalismo naquele período.

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Robert Schwarczescreveu o seu livro justamente nesse período de efervescência das ideias libertárias na América Latina. A sua teoria é construída tomando em consideração os escravos e os homens livres (de classes sociais menos favorecidas), cuja liberdade era cerceada pelo “favor”. Isso, em tese, não permitiria que o Brasil se tornasse de fato liberal. Ao criticar esse modo peculiar de apropriação das ideiasliberais, o autor reafirma sua posição contrária ao clientelismo e sublinha que as ideias liberais somente encontrariam terreno fecundo caso não houvesse a escravidão e a relação entre homens livres e os “grandes” não estivesse estabelecida pela pratica geral do favor. Maria Sylvia de Carvalho Franco rechaçou esse posicionamento sobre o liberalismo brasileiro, ou a falta dele, no século XIX. Segundo aautora, ao elaborar esse raciocínio, Schwarcz acaba por reproduzir o que ele coloca como questionamento: a relação de dependência do Brasil como colônia às ideias metropolitanas. Para ela, a existência da escravidão não era contraditória ao liberalismo, mesmo porque o modelo escravista visava o lucro. De acordo com Carvalho Franco, as ideias estavam, portanto, em seu lugar. O Brasil estaria inseridodentro dessa ordem capitalista, mesmo que a sua função fosse de produtor de matérias-primas para os produtos industrializados na metrópole. Em outras palavras, o liberalismo se fazia presente nessa sociedade. As ideias não estavam fora do lugar porque foram produzidas e difundidas naquele momento histórico. Pensadores clássicos, como Locke, já haviam se debruçado sobre o tema e lançado as...