Práticas Funerárias E Atitudes Perante A Morte

Páginas: 23 (5646 palabras) Publicado: 14 de julio de 2012
Práticas funerárias e atitudes perante a morte na Terra da Maia (Sécs. XVII-XX)
primeira abordagem

José Augusto Maia Marques1

“Vida e morte não são mundos em oposição. São apenas duas flores gémeas numa mesma jarra,”
(Octavio Paz)

Esta comunicação pretende dar conhecer os primeiros resultados das pesquisas que estamos a efectuar para um trabalho de fôlego sobre este tema. Embora aindalonge da conclusão, eles permitem já adiantar alguns aspectos curiosos. Utilizando as fontes normalmente compulsadas para estes efeitos (testamentos e registos paroquiais), procurou-se, através do cotejo com outras fontes (escrituras de dote e casamento, estatutos das confrarias do subsino das freguesias, documentos e relatos da época) e de outros recursos (arquivos paroquiais, arquivosparticulares e Arquivo Municipal da Maia), estabelecer um percurso de cruzamento de informações que nos possibilitasse um conhecimento mais vasto e mais abrangente sobre as várias vertentes da temática em apreço. Relembra-se a douta assistência que se trata aqui de apresentar resultados preliminares de um trabalho longe do fim. Ou, para aplicar linguagem apropriada ao tema, «ainda o funeral mal saiu daigreja»...

A Morte e o morrer – breve perspectiva histórica
“Nem a morte nem o sol podem ser olhados de frente,”
(Pascal)

Foi o historiador francês Philippe Ariès2 quem, nos anos 60, sistematizou e periodizou o que até então se sabia sobre a Morte, inaugurando, sem dúvida, um novo período em que a reflexão histórica, sociológica e antropológica sobre a morte e o morrer se tornou numa práticafelizmente bem menos rara3. É assim que Ariès considera várias «idades» ou «épocas» no que toca às atitudes do homem perante a morte.
1 2

Da Câmara Municipal da Maia e do Instituto Superior da Maia. Philippe Ariès, História da Morte no Ocidente. Lisboa, Teorema, 1989. 3 Veja-se, também de Phillippe Ariès, os dois volumes da obra O Homem perante a morte, Lisboa, Europa-América, XXXX 1

Aprimeira, que ele baliza das origens ao séc. XII, é a época da morte domesticada. A pobreza e a miséria extremas forçavam a uma enorme exposição à morte, o que fazia com que as pessoas estivessem muito familiarizadas com ela. A crença numa vida para além da morte, isto é, num modo de sobrevivência do defunto, era uma forma de domar ou domesticar a morte, considerando-a como um sono que servia deantecâmara da vida eterna. Receava-se então a morte súbita, aquela que não houve tempo para preparar. A morte esperada era preparada com cuidado, cumprindo-se todos os rituais com simplicidade, de modo cerimonial mas sem dramatismos nem emoções exageradas. Do séc. XII ao séc. XV o homem começa a revelar outras preocupações. É o período da morte de si próprio. A morte na primeira pessoa. No leito omoribundo revê, em segundos, toda a sua vida – as suas faltas e as suas glórias, os seus amores e os seus ódios. Assim, preparar a sua morte significaria resgatar todas as faltas cometidas em vida, apresentando-se para o juízo final com as contas equilibradas. Vem depois a morte romântica. Acompanhando o movimento que

genericamente se designa de romantismo, os temas relacionados com a morteenchem-se de uma carga mórbida quase erótica, revelando enorme complacência com a morte e o morrer, a dor e o sofrimento. A morte é encarada como ruptura, afastando o homem da sua vida normal e da sociedade racional, lançando-o num mundo irracional e cruel. A morte, muito embora não desejada, é admirada pela sua beleza. No séc. XIX a atitude perante e morte altera-se. Aqueles que, rodeando o leito,assistem aos últimos momentos do moribundo, emocionam-se, rezam, choram, extravasando uma dor apaixonada. O homem torna-se intolerante para com a morte, já que ela é encarada como separação, afastamento. O que se receia é, assim, a morte do próximo. Não já a morte de si mesmo, mas a morte do outro, do vizinho que se estima, do amigo, da pessoa amada. No séc. XX novamente se altera o sentido das...
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