Pra Frente, Brasil

UNIVERCINE
SETEMBRO – 2012
Pra Frente, Brasil (1982)


O ano é 1970, a seleção brasileira de futebol disputa com a Itália o final da Copa do Mundo no México. Em meio ao êxtase da torcida brasileira que vibra frente a um dos eventos mais populares do país, no Brasil, prisioneiros políticos desaparecem e são torturados por um regime de governo autoritário que marcou um dosperíodos mais duros da história recente do país: a ditadura militar.
Usando este enredo, Roberto Farias lança, em 1982, o longa-metragem Pra Frente Brasil, um dos primeiros filmes brasileiros a retratar abertamente o que foi o regime militar no país.
Testando o período da “Abertura”, Farias produziu este filme com financiamento da Embrafilme[1], que havia presidido de 1974 a 1979.Inicialmente barrado, o filme foi classificado com base na alínea D do artigo 41 da Lei 20.943, de 1946: “interdição, quando a obra for capaz de provocar incitamento contra o regime vigente, a ordem pública, as autoridades e seus agentes”, mas, depois, recebeu apoio do presidente[2] da Embrafilme na época de sua produção e conseguiu o financiamento necessário para prosseguir o trabalho.
Ofilme mostra a dualidade de importantes eventos que marcaram o país. De um lado, o modo com que os militares exerciam o poder de repressão aos opositores do governo do então presidente Emilio Garrastazu Médici (1969-1974) - conhecido como o mais duro e repressivo governo militar, ganhando a alcunha de “anos de chumbo”; do outro, a disputa pelo título na Copa do Mundo, evento importante para a criaçãode uma identidade nacional. Como afirma Guedes (2002),
“as Copas do Mundo constituem-se, para os brasileiros, em verdadeiros rituais nacionais, ocasiões em que se celebra a brasilidade, construção simbólica da unidade nacional “suspendendo-se”, de certo modo, as diferenças e desigualdades que permeiam a estrutura social”.
Assim, Pra Frente Brasil é visto sob a ótica dafamília de Jofre (Reginaldo Farias), um trabalhador comum da classe média carioca que, ao dividir o táxi com um militante de esquerda, é confundido com um ativista político desaparecendo em meio à exaltação da repressão militar. Sua mulher, Marta (Natália do Valle), junto com o cunhado Miguel (Antônio Fagundes), empreendem uma busca a Jofre, deparando-se com a resistência da polícia em investigar ocaso.
Em paralelo, somos apresentados às cenas reais dos jogos entre Brasil e Itália na decisão da Copa de 1970, o que deixa claro, diante da perspectiva do filme, o modo como o governo militar tentou usar o evento esportivo como forma de ocultar o que ocorria naquele período da nossa história, como a repressão política e a tortura, por exemplo. De certo modo, somos apresentados também àalienação e a indiferença da população brasileira diante de tais episódios. Afinal, como aponta Gaspari (2002), “o milagre brasileiro e os anos de chumbo foram simultâneos. Ambos reais, co-existiam negando-se. Passados mais de trinta anos, continuam negando-se. Quem acha que houve um, não acredita (ou não gosta de admitir) que houve o outro".
Daí, este evento esportivo, visto como um dosmais importantes na relação de criação de uma identidade nacional seria, então, o meio para o governo fazer propaganda política sem parecer ser uma. Foi por meio de criação de músicas, como Pra Frente Brasil, que celebrou a vitória da Copa, e até mesmo de uma campanha maciça para a conquista do tricampeonato, que a AERP (Assessoria Especial de Relações Públicas da Presidência) - órgão responsávelpela propaganda nos meios de comunicação - conseguiu associar o governo militar a algo constituidor da “brasilidade”.
Como consequência, a alienação por parte da população, neste momento, foi a brecha para a manipulação de uma propaganda institucional, que, usando o futebol como metonímia do país, garantiu o apoio dos brasileiros nas medidas governamentais, principalmente durante o período...