Verdade material
Demetrius Nichele Macei[1]
1. O que é a “Verdade”?
Para Plácido e Silva[2], verdadeiro é tudo o que é real, autêntico, legítimo, fiel, exato, opondo-se assim ao sentido de inexistente, falso, ilegítimo, infiel.
Sem adentrar nas questões filosóficas que envolvem o tema, temos um senso comum do que é o verdadeiro e o falso,o real e o inexistente etc. Este senso comum é suficiente para dizer que não existe meio-verdadeiro, ou meio-real. Ou seja: a Verdade é conceituada de modo absoluto, não depende de fatores extrínsecos. Na linguagem popular: “A verdade é uma só”.
Contudo, a teoria do Direito Processual reconhece duas espécies de verdade, catalogadas em caráter principiológico: a verdade formal e a verdadematerial.
A verdade formal é um dos princípios regentes do Direito Processual Civil. Estará sendo atendido tal princípio quando o Juiz desconsiderar tudo aquilo que não conste nos autos. Trata-se de mais uma das tantas ficções do direito, a de “classificar” as Verdades para dar-lhes efeitos diversos.
A verdade material, por sua vez, é o oposto. O julgador pode considerar fatos ocorridosque não tenham sido necessariamente comunicados pelas partes nos autos.
O processo penal é regido pela Verdade Material.
A conclusão preliminar é de que a acepção de verdade é diametralmente oposta em razão da espécie de Processo. Conclusão no mínimo curiosa. Pergunta-se aqui: que diferença tão importante é essa que justifica situações tão antagônicas? Em que difere a norma processualcivil da penal, neste particular?
Na lição de José Frederico Marques, as situações que contempladas na chamada jurisdição civil é obtida por mera exclusão. Em outras palavras, o processo civil regeria os litígios que não sejam especiais (militar, do trabalho etc), não-judiciários (Poder Legislativo, Tribunal de contas) ou Penais. Segundo o autor, a chamada legislação ordinária compreende aatividade do Estado na solução dos conflitos penais e civis.
Assim, o processo civil rege todos os conflitos ordinários não-penais[3].
A jurisdição, enquanto poder do Estado em “dizer o direito”, é exercido de forma diferente quando a questão é civil ou penal. No cível, o Estado limita-se a garantir o direito de ação, por vias estreitas de acesso à justiça e de prazos fulminantementepreclusivos. No crime, o aparato estatal põe-se claramente entre o Estado e o acusado, entre a pretensão punitiva e o direito a liberdade.
Assim o Processo Penal protege enquanto o Civil preside. Não deveria ser assim. A tutela jurisdicional do Estado visa em última análise a paz social e a paz social é plenamente atingida quando é dado a cada um o que é seu.
A chamada verdade materialtambém tem sua irradiação em outros ramos do Direito. Princípio basilar do Direito do Trabalho é a chamada Primazia da Realidade[4]. No Direito administrativo o Princípio da Verdade material já é consagrado[5] como imperativo.
2. O Princípio da Segurança Jurídica
Cândido Rangel Dinamarco, estudando o que denomina ser o escopo social do processo, conclui que as relações sociais causamfrequentemente no indivíduo insatisfações, sentimentos psíquicos que costumam acompanhar a percepção ou a ameaça de uma carência. Essa insatisfação é que pretende o Estado eliminar na sua atividade jurisdicional[6].
O Estado procura então criar um clima favorável entre as pessoas, um clima de paz social, enfim. Isso ocorre mesmo havendo a parte vencida, pois as partes aceitam a decisão como definitivae soberana. Obviamente, para ser reconhecida a decisão como definitiva e soberana, e sobretudo ser respeitada pelas partes e terceiros, a mesma deve ser obtida por meio de critérios justos[7].
É aí que surge o Princípio da Segurança Jurídica, pois diante da impossibilidade de tomar a decisão absolutamente justa, seja pela falta de elementos fáticos, seja pela falta de tempo, desse...
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