A prática etnográfica como compartilhamento do tempo e como objetivação

Páginas: 39 (9670 palabras) Publicado: 21 de junio de 2011
MANA 12(2): 503-520, 2006

ENTREVISTA A PRÁTICA ETNOGRÁFICA COMO COMPARTILHAMENTO DO TEMPO E COMO OBJETIVAÇÃO
Johannes Fabian

Johannes Fabian é um dos antropólogos mais conhecidos na atualidade e bastante identificado com o pensamento crítico. Valorizando fortemente a dimensão etnográfica, escreveu numerosos trabalhos sobre diferentes aspectos da vida e da cultura de populações da África. Nãose considera contudo estritamente um africanista. O seu livro mais conhecido, Time and the other: how anthropology makes its object (Columbia University Press, New York, 1983), foi (e continua a ser) uma referência importante para os debates teóricos e epistemológicos sobre os limites e as possibilidades da interpretação antropológica. Na última década, JF veio a explorar novos domínios daantropologia (como a iconografia, a performance, a ética e as condições de objetividade e subjetividade), produzindo trabalhos inovadores. Esse foi o caso de Remenbering the present: painting and popular history in Zaire (University of Califórnia Press, Berkeley & Los Angeles, 1996), Out of our minds, explorations and madness in Central Africa (University of California Press, 2000), Anthropology with anattitude. Critical essays (Stanford University Press, Stanford, 2001).

Em junho de 2004, fez uma visita ao Brasil a convite da Associação Brasileira de Antropologia (ABA) e proferiu uma das conferências centrais na XXIV RBA, ocorrida em Recife. Em sua passagem pelo Rio de Janeiro, visitou o Museu Nacional onde ministrou uma palestra no PPGAS e foi convidado a dar uma entrevista para a revistaMana. No dia seguinte, no Hotel Glória, durante quase três horas, respondeu de forma sempre muito clara e direta às questões formuladas por João Pacheco de Oliveira, Federico Neiburg e Thaddeus Blanchette. A transcrição da entrevista gravada foi realizada por este último e a tradução ao português foi feita por Amir Geiger, cabendo aos dois primeiros suas edição e revisão final.

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ENTREVISTAFN: O que gostaríamos de saber em primeiro lugar é como o senhor chegou à antropologia. Bem cedo recebi ensino etnológico — primeiro na Áustria, mais tarde em Munique, onde estudei por um breve período. Depois, fui para Chicago, onde tive meu treinamento. Portanto, meu primeiro contato foi com a etnologia de tipo européia clássica — cultural-histórica e difusionista, pode-se dizer. Tive doisprofessores, provavelmente conhecidos por vocês, e certamente pelos africanistas. Um deles foi Paul Schebesta, meu primeiro professor, conhecido por seu trabalho sobre os pigmeus. Foi um daqueles heróisexploradores que andaram milhares de quilômetros pela floresta Ituri. Mas ele era também um etnógrafo excelente, e eu muito lhe devo. Quanto mais velho fico, mais percebo o quanto lhe devo — nãotanto em termos de conhecimento, mas de atitude em relação à etnografia. Schebesta foi discípulo de Wilhelm Schmidt, e daí se poderia supor que fosse uma espécie de difusionista dogmático — coisa que ele absolutamente não era. Era um etnógrafo, e tinha um tipo de abordagem muito pessoal, nada convencional; de seu ensinamento se apreendia que, nos grupos em meio aos quais trabalhava, ele sempre via aspessoas. Elas não eram meramente suas fontes de informação; ele vivia com elas. E era capaz de evocar em nós impressões muito vívidas de como era sentar-se junto a um pigmeu e conversar sobre suas concepções a respeito de Deus. Esse era o tema que estava na ordem do dia e Schebesta, que trabalhou entre os pigmeus — assim como Wilhelm Koppers, na Índia, e Martin Gusinde, na Terra do Fogo — foraenviado por Wilhelm Schmidt para encontrar o “verdadeiro monoteísmo”. Schebesta não retornou com os dados que Schmidt queria. Encontrou uma divindade, mas o que ele imprimiu

em nós — e, mais uma vez, trata-se de algo a que somente agora dou o devido valor — foi a absoluta contemporaneidade daquilo que classificaríamos como religião e de coisas que classificaríamos como magia. Ele não aceitou a...
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